Hoje de manhã estava a tomar o pequeno almoço, e a escassos metros de mim (que é como quem diz na mesa ao lado) estava um casal na ordem dos seus cinquenta e poucos anos. A senhora estava a comer em silêncio, e ele em silêncio estava apesar de não estar a comer. Ele era cego. Estava sem óculos, de olhar perdido, mal sabendo que se tivesse visão estava especado a olhar para uma parede! A dada altura ele diz "Estás aí?", e a mulher responde "Claro que estou, até já te perguntei se querias um bocadinho de torrada!". Ele disse-lhe "não disseste nada, ou não te ouvi, até pensei que tinhas saído, estás aí em silêncio!". Ela respondeu-lhe em tom de brincadeira e carinho "já nem me ligas nenhuma, eu aqui a oferecer-te pãozinho e tu já nem dás por mim!".
A senhora levantou-se e avisou-o que ia só pagar. Foi nesse momento que ele se virou ligeiramente e os nossos olhares cruzaram-se, inútilmente, pois nunca conseguiria perceber que eu estava mesmo à sua frente...
Estive ali um pouco a pensar, ao acabar o pequeno almoço, e cheguei à conclusão que pelo comportamento dele enquanto ali esteve e depois ao levantar-se, que a cegueira não seria de nascença. Aí não pôde deixar de me ocorrer "E se fosse eu?".
3 comentários:
Tocaste-me na ferida... É um dos meus grandes medos, sem dúvida.
Para mim não é um medo, mas é uma ideia sem dúvida nenhuma.
Às vezes não damos valor ao que temos nem ao que somos...imagine-se a dependência, a desorientação...
Há que dar valor a quem enfrenta as suas deficiências físicas como uma coisa que faz parte de si, e não como um castigo ou uma cruz.
Até vos digo mais...
deveriamos simplesmente viver cada dia e momento como se realmente fosse o último.
Se não vivessemos tão mergulhados nos pequenos problemas que existem ou que, por vezes, inventamos... aproveitariamos a vida muito melhor e com quem amamos.
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